A Ética Natural

Ruan Bessa
25 min readJan 22, 2021

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Por Oliver O’Donovan
Tradução e Revisão: Ruan Bessa

Divergências Morais

Para começar com a mais trivial das observações: julgamentos éticos são controversos. Por quê?

Em primeiro lugar, controvérsias surgem sobre questões de fato. Alguns acham, e alguns não, que a maconha causa dano ao corpo e a mente daqueles que a fumam. Quais dessas crenças é verdadeira fará diferença considerável em nosso julgamento sobre o fumo da maconha. Há uma tradição filosófica respeitável que sugere que toda controvérsia moral se deve, em última análise, à falta de informação concreta. Os utilitaristas do século XIX, por exemplo, que desfrutam uma espécie de renascimento hoje, pensavam que julgamentos morais eram essencialmente uma questão de previsão acurada: se pudéssemos saber exatamente quais consequências decorreriam de cada um dos cursos alternativos de ação, não haveria dúvidas sobre qual deles seguir. Em tal teoria, não há de fato algo como uma divergência genuinamente moral. Valores como tais não estão em discussão — eles deveriam ser incontroversos, ou talvez, mais agressivamente, inegociáveis. Dentro da comunidade da razão, apenas os fatos podem ser uma questão de dúvida ou disputa legítima.

Mas as controvérsias morais mais profundas e assustadoras resistem a esse tipo de racionalização.

Motivo pelo qual uma segunda tradição do pensamento filosófico tem representado divergências morais como um função de compromissos pessoais inescrutáveis. Se choques de convicções morais não podem ser resolvidos através de informação factual, dá-se a impressão que a convicção moral não é suscetível a qualquer arbitragem racional. Há um espaço para razão, é claro: a razão esclarece quais são as alternativas, a razão pode nos dizer o que estará em jogo se sustentarmos certo julgamento de forma consistente. Mas quando a razão tiver cumprido a sua função, devemos simplesmente fazer nossa escolha. A razão é a serva de decisões pessoais que vão além da razão; e não é possível que argumentos racionais possam exigir qualquer coisa de alguém além de que ela seja verdadeira para consigo mesma. Divergências morais são irresolúveis e temos que conviver com elas.

Há certos tipos de decisões às quais esta espécie de descrição se encaixa muito bem. “Não há explicação para gostos,” e a maioria de nós consegue lembrar de decisões que tomamos, para as quais não há, literalmente, nenhuma explicação — não por serem irracionais, mas porque transcendem considerações racionais. Um exemplo seria a decisão de seguir esta ou aquela carreira — uma “vocação,” como a gente diz, no sentido de que Deus nos chamou pessoalmente a isto — ou a decisão de casar com o cônjuge que casamos. Sobre essas decisões, poderíamos receber conselhos de certo tipo, mas não conselhos morais, pois ninguém poderia se colocar em nosso lugar e nos dizer se amávamos Elvira o suficiente para casar com ela, ou se gostávamos de estudar o suficiente para nos tornarmos acadêmicos profissionais. Mas logo essas decisões não eram decisões “morais” no sentido comum do termo. João não é capaz de formar uma boa opinião sobre se Felipe deveria casar com a Ana, mas pode formar uma opinião sobre se Felipe deveria se casar com uma divorciada. Julgamentos morais, ao contrário de escolhas pessoais, pertecem ao domínio público da razão. Avaliamos as posturas morais das outras pessoas e esperamos que elas avaliam as nossas. Discutimos sobre elas, até ficamos brabos acerca delas, tudo isso pressupõem algum critério público de certo e errado. Esta segunda explicação de divergência morais é tão inadequada quanto a primeira.

A Ética Natural

Há uma terceira explicação tradicional que chama nossa atenção. Foi a visão aceita pelo Cristianismo medieval, a qual herdou da filosofia Platônica e Aristotélica e, como consequência, tem tido pouco apoio nas culturas Protestantes. Mas recentemente há um interesse renovado nela. Às vezes é chamada de ‘teleologia natural’; mas irei me referir a ela simplesmente como ‘a ética natural.’

É possível concordar inteiramente sobre os fatos de uma situação, e ainda sim discordar sobre como ele deveria ser descrito. ‘O governo agiu para protejer a indústria de laticínios,’ imaginamos alguém dizendo, ‘eliminando o excedente de laticínios.’ Enquanto outra pessoa talvez diga: ‘Quanta comida foi desperdiçada!’ As descrições são diferentes porque fazem uso de categorias diferentes. Mas isso é porque elas pressupõem visões diferentes do que o mundo de fato contém. Dois homens olham para o leite: um o vê como “produto,” uma espécie de artefato da “indústria” de laticínios; o outro o vê como “alimento.” Mas este, ao vê-lo como alimento, inevitavelmente deve pensar que este tem um propósito: alimento é para nutrição. E isso, por sua vez, o compromete a avaliar como um “desperdício” quando o leito é jogado no mar. O outro, ao vê-lo como produto, é igualmente obrigado a inferir que o leite não tem finalidade natural, visto que a finalidade de um produto é simplesmente aquela que seu produtor lhe confere. Na verdade, ao descrever o leite como “produto,” ele afirma que “alimento” não existe de fato, pelo menos não como um tipo natural de coisa. Em seu contexto de pensamento “alimento” só poderia descrever um uso para o qual agentes humanos poderiam decidir dar a este ou aquele produto ou esta ou aquela matéria-prima. Invocando uma distinção tradicional grega: um vê alimento como uma categoria que existe “na natureza,” o outro como uma categoria que existe somente como “convenção.”

A ética natural nos oferece esta explicação para divergências morais: quando seres humanos olham para o mundo como um todo, eles vêem coisas diferentes. Eles podem concordar acerca dos fatos; mas a estrutura da realidade por trás dos fatos eles veem de maneira muito diferente, e isto afeta a maneira como eles descrevem e entendem os fatos. Existe de fato algo como “alimento,” ou somente produtos de mercado? Existe regra e obediência, ou apenas um contrato social? Existe dádiva ou apenas formas mais sutis de troca? Existem laços naturais, ou apenas associações voluntárias? Neste nível metafísico surgem muitas das divergências morais mais profundas e dolorosas.

É meu objetivo neste artigo defender a ética natural, ciente do fato de que estou na presença da ciência e da teologia, ambas as quais, por suas próprias razões, desejaram negá-la.

Voluntarismo e Nominalismo

Os filósofos da ciência freqüentemente enfatizam que o empreendimento científico Ocidental surgiu no fim da Era Medieval num ambiente intelectual marcado por dois movimentos paralelos na filosofia: “voluntarismo” e “nominalismo.”

“Voluntarismo” era a crença de que o bem e o mau são determinados, não pelo intelecto de Deus, mas por sua vontade. Um distinção nítida foi feita entre fato e valor. A natureza, enquanto expressão da mente de Deus, era isenta de valor; as questões do bem e mau giravam em torno de qual era a vontade de Deus ordenada de tempos em tempos. Se você é um voluntarista, você não pode mais afirmar que Deus fez a soja para nossa nutrição; você só pode afirmar que Deus fez a soja, por um lado, e agora ele ordena que a soja nos alimente, por outro lado, como ele ordenou que os corvos alimentassem Elias. Outra forma de expressar isto seria dizer que os propósitos de Deus devem ser conhecidos somente através de sua obra providencial no conduzir a história, não em sua obra criadora que precede a história.

Com a filosofia do voluntarismo, sustenta-se que a ciência aprendeu sua abordagem desinteressada à natureza, como algo a ser “questionado,” observado e compreendido, sem amor ou obediência. Valores podem ser impostos à ordem natural pela tecnologia, mas não discernidos dentro dela. Para os fins do pensamento científico, a teleologia natural é rejeitada.

“Nominalismo,” por outro lado, era a alegação de que “tipos” de coisas não tem qualquer existência real na natureza, antes são simplesmente interpretações que a mente impõem a fenômenos particulares. O particular é o real, o universal é um construto da mente. Deus criou a mim, a você, e à mesa, mas é a mente humana, e não o que Deus fez, que nos classifica como humanos e a mesa como objeto inanimado. Esta filosofia tornou possível a busca pela economia da explicação. Se os tipos são convencionais, e não naturais, cabe a nós decidir quantos deles escolhemos reter em nossa compreensão do mundo. Podemos forçar uma gama tão ampla de fenômenos a um repertório tão limitado de categorias quanto acharmos capazes de nos safar.

Disto segue o que às vezes tem sido chamado de “fragmentação” da realidade sob a disciplina da investigação científica. Uma ciência limita a área de seu interesse à gama de fenômenos que aparentam ser sucetíveis ao seus padrões de pensamento. Duas ciências distintas podem cobrir o mesmo campo, e cada uma oferece o que aparenta ser uma descrição completa dele, mas as descrições não coincidem. As filosofias da ciência freqüentemente explicam isso através de alguma teoria dos “aspectos” da realidade: alguns de nós estão familiarizados com o elaborado sistema proposto por Herman Dooyeweerd sob título de “esferas de soberania.” Mas isto é refletir de volta na natureza o que de fato é uma fragmentação do conhecimento. O mundo Ocidental escolheu conhecer o universo em partes ao invés de como um todo, e em economia ao invés de na diversidade; e esta política deliberada, embora tenha rendido um nível extraordinário de domínio técnico, gerou seus próprios tipos de confusões. A confusão ética é endêmica a este modo de conhecimento, pois se não há uma maneira aceita de descrever o que vemos, não pode haver uma maneira aceita de responder o que vemos.

Ciência e a Ética Natural

É por isto, então, que se costuma dizer que a ética natural recebeu seu golpe mortal no fim da Era Medieval daquele infante Hércules, a revolução científica, naquela época deitado no berço. O primeiro princípio da ética natural é que a realidade nos é dada, não apenas em fenômenos discretos e isolados, mas em tipos. As coisas têm um sentido natural. Não é uma questão de interpretação dizer que a mesa é uma artefato inanimado enquanto você e eu somos seres humanos; é uma questão de discernir corretamente a situação. O segundo princípio é que estes tipos dados não estão isolados uns dos outros, mas se relacionam entre si dentro de um padrão dado dentro da ordem das coisas. Saber o que é aquela coisa é saber que tipo de coisa ela é, e saber que tipo de coisa é, é saber como ela se encaixa no todo, isto é, para que serve. As coisas têm uma finalidade natural. Ao compreender a finalidade natural de algo, atendemos às suas reivindicação sobre nós e, portanto, somos capazes de deliberar sobre nossa resposta aquela reivindicação. Mas a revolução filosófica do final da Era Medieval tentou dispensar de ambos os princípios.

Ela tentou, mas teve sucesso? A ciência hoje, completamente integrada a uma visão de mundo que aceita a teoria da evolução como uma premissa quase que inquestionável, pode ser vista como tendo efetuado nada mais do que a troca de uma espécie de teleologia por outra. Aqueles que consideram a revolução nominalista-voluntarista como uma libertação magnífica do pensamento para a ‘objetividade competente’ talvez sintam que o cão retornou ao seu vômito. [1] Mas podemos nos perguntar se o cão se quer chegou a deixar seu vômito. Alguns tipos de descrições científicas simplesmente não podem ser efetuadas não-teleologicamente. As descrições biológicas e zoológicas são examplos clássicos. Como descrever os órgãos digestivos sem afirmar que eles são para digestão, ou o rabo de um cavalo sem afirmar que ele é para proteção contra as moscas? Foram estas ciências que mais cedo abraçaram o pensamento evolucionário e com mais determinação, pois precisavam de algum princípio teleológico para dar sentido ao seu próprio trabalho.

E portanto ao tentar tornar todos os tipos relativos, o pensamento cientifico não absolutizou ao mesmo tempo, a um nível extraordinário, as categorias de observador e observado? Uma forma deste absolutismo foi o “humanismo,” que opõem a raça humana, o observador, a natureza, o observado. Mas à medida que o escopo da ciência se estendeu e passou a incluir a própria humanidade, o humanismo foi superado pelo mesmo absolutismo em formas novas e mais alarmantes. A própria mente observadora e manipuladora torna-se algo absolutamente em oposição ao mundo. Logo, longe de abolir a metafísica, a abordagem científica da realidade apenas trocou um conjunto de suposições metafísicas por outras mais questionáveis.

Mas se o programa filosófico que deu origem à ciência foi incapaz de uma realização consistente, estamos livres de uma ansiedade atazanada. Se o conhecimento científico fosse uma maneira de conhecer o mundo que pudesse ser realizada consistentemente, teríamos que optar entre este tipo de conhecimento deliberadamente fragmentado e a percepção do mundo como um todo integrado que a nossa fé exige de nós. A divisão intelectual, que todos nós que aprendemos a conhecer o mundo das ambas maneiras experimentamos, seria então uma ferida sem cura. Mas se for o caso de que o objetivismo científico é destinado a servir alguma outra forma de conhecer o mundo, logo existe a possibilidade que ele possa servir à maneira cristã. Quando percebemos que a descrição das coisas com categorias fluidas e sem teleologia nunca será uma descrição final, então podemos aceitar a utilidade de tal descrição como uma espécie de experimento mental para alcançar maior clareza que vêm do conhecimento minucioso. Se decidirmos, como pessoas de fé, que o leite não é apenas um produto lácteo, mas alimento, aí podemos considerá-lo também, embora de maneira provisória e hipotética, como produto lácteo. Desde que saibamos que esta é uma distorção experimental do pensamento, não a essência da coisa, podemos obter conhecimento olhando através das lentes distorcidas. Nos resta portanto reintegrar o que vemos através das lentes ao padrão total de compreensão; e é por isso, suponho, que nos é adequado, como representantes de tantas disciplinas, discutirmos as questões da ética, não em nossas disciplinas isoladas, mas juntos.

História — Revelação e Escatologia

Os pensadores que compreendem o desenvolvimento do pensamento Ocidental desta maneira, quer o acolhem ou o deploram, estão inclinados a atribuir uma boa parte de seu crédito ao Cristianismo.

É verdade que por mais de um milênio de pensamento e vida cristã a unidade tardia platônica entre fato e valor permaneceu incontestada na igreja Ocidental (como ainda é na Oriental); mas isto, diz-se, apenas mostra quão lento o Cristianismo foi em se emancipar da sua tutela helênica e entrar em sua herança judaica. A divisão entre fato e valor já estava implícita na concepção do Antigo Testamento que chamamos de “história da salvação,” a ideia de que sentido e valor não se encontram nas estabilidades da natureza, mas nos dinamismos da história. Esta concepção reaparece no cristianismo de duas formas. Por um lado, baseando à noção de uma revelação histórica do significado do universo na encarnação do Filho de Deus. Por outro lado, baseando à crença de que a história como um todo deve alcançar seu propósito na intervenção final de Deus e o estabelecimento de seu reino.

O movimento nominalista-voluntarista do século XIV tem mais creditado em sua conta do que a promoção do pensamento científico. Ele também foi a inspiração filosófica para os reformadores. Ele lhes deu as armas para atacar a epistemologia Tomista que aceitava em princípio (e para ser justo com São Tomás, deve-se enfatizar as palavras “em princípio”), que o homem natural podia perceber valores naturais e significados naturais sem o auxílio da revelação. A isso os reformadores reagiram com uma ênfase poderosa e autenticamente cristã na função decisiva da revelação. Mas a revelação para eles era na verdade uma questão cristológica: questionar a necessidade da revelação era questionar a necessidade de Cristo. O significado do mundo, o “Logos,” veio no Natal; o ser humano sem Natal é um ser humano sem sentido. A concessão de significado é parte da obra salvadora de Deus na história, pois na natureza o ser humano não consegue discernir nenhum significado.

O que a doutrina da revelação efetua em relação o sentido natural, sua expectativa escatológica efetua em relação a finalidade natural. No cristianismo não é possível pensar ou falar sobre o significado do mundo sem também falar da transformação ao qual o mundo está destinado. O problema do mau não é resolvido pela afirmação de uma profunda ordem cosmológica no presente, mas pelo anúncio confiante dos propósitos de Deus para o futuro. Aquele que veio à terra como o significado, veio também como o Sentido ou Realização. Para entender a primeira vinda de Cristo é necessário ter a expetativa da segunda vinda.

É claro que existem, notoriamente, duas formas de se viver em expectativa. Podemos acreditar no valor da transformação intermediária, “preparando o caminho para o Senhor,” e logo nos comprometer a uma vida ativa; ou podemos ter a sensação de que a transformação final torna irrelevante toda mudança penúltima, e nos resignarmos a uma vida de sofrimento em esperança. Mas o que essas duas atitudes têm em comum é muito mais importante daquilo que as diferencia. Ambas têm uma visão negativa do status quo. Não há propósito natural ao qual possamos responder em amor e obediência. O destino da natureza deve ser imposto a ela, seja através da nossa atividade ou a de Deus. O propósito do mundo está fora dele, naquela nova Jerusalem que há de vir do céu preparada como um noiva para o noivo.

Esta descrição do impacto cristão sobre a ética natural teria aceitação bastante ampla entre aqueles que a deploram bem como aqueles que a acolhem. Porém, sou levado a crer que há muitas coisas importantes que ela deixa de fora.

Abordando primeiro o ponto sobre a revelação. A revelação na história é certamente o eixo central da epistemologia cristã. Mas epistemologia não é a mesma coisa que ontologia, por mais que o mundo protestante possa ter freqüentemente confundido as duas coisas. “Natureza” pode ser contrastada com “revelação” como um programa epistemológico; ou pode ser contrastada com “história” para fazer uma distinção ontológica. [2] Os importantes pontos epistemológicos que a Reforma teve que levantar não devem abrigar uma ontologia destrutiva e semi-cristã. Uma coisa é dizer que até que o Verbo encarnasse, o ser humano não poderia discernir nenhum sentido na natureza; outra bem diferente é dizer que até que o Verbo encarnasse, a natureza não tinha sentido. A revelação é a solução para a cegueira do ser humano, não para um vazio da natureza. Fato, a própria cegueira do ser humano é parte de uma ruptura na natureza, que chamamos de queda. Mas o próprio fato que a natureza poder ser considera rompida e desordenada mostra que ela não pode ser inerentemente sem sentido. Em seus primeiros dias, a igreja ficou intrigada ao encontrar alguns em seu meio crendo que o mundo foi criado por uma divindade maligna, hostil ao Deus da redenção. Ao rejeitar essa especulação, ela fez uma distinção nítida e necessária entre a ideia de que o mundo era simplesmente caótico e, o que entendia ser o ensino do evangelho, que o mundo era uma criação ordenada tragicamente estragada. O Protestantismo, ao tornar a questão epistemológica suprema sobre a ontológica, muitas vezes tendeu a desestabilizar o equilíbrio que os Pais da Igreja alcançaram.

A escatologia cristã, abordando o segundo ponto, também deve ser vista à luz da doutrina da criação. O cristianismo é uma fé escatológica, tendo como seu tema central a experiência e a esperança de redenção do mau. Mas essa redenção não deve ser entendida de forma dualista como o triunfo de um deus-redentor bom sobre um deus-criador mau. É porque Deus é o criador da natureza que ele a redimi e irá redimi-la de seu estado de corrupção. Aquele que é o Salvador do mundo é também o “Logos,” ‘por meio do qual todas as coisas foram feitas.’ Ele é o Segundo Adão, restaurando aquilo que o Primeiro Adão perdeu. Criação e redenção não estão em antítese hostil, mas em complementaridade, cada uma fornecendo o contexto no qual compreendemos a outra.

O Equilíbrio entre Natureza e História

Quando o pensamento falha em manter o equilíbrio cristão entre o sentido dado na ordem natural e o sentido revelado no curso da história, ele está à mercê de um naturalismo estático ou de uma crença indeterminada no progresso. Existem “éticas naturais” com as quais o cristianismo não pode compactuar. O respeito pelas ordens dadas pode facilmente se tornar uma forma de idolatria. A família, o estado, o mundo animal, as montanhas, as estrelas no céu, o próprio ser humano, podem todos comandar nosso amor e lealdade de uma forma que não permite a compreensão de seu devido lugar no esquema das coisas. Amamos o que é, apenas porque o confundimos com algo que não é. Supomos que nossa tribo é o todo ou a mais importante da humanidade, supomos que os planetas moldam nossos destinos, supomos que o ser humano é o senhor de todas as coisas. Muito tem sido honrado como
“natural” que é puramente convenção, o produto de certas circunstâncias históricas passageiras, e desta forma foi posta grande opressão sobre as almas dos seres humanos.

Mas nem mesmo uma ética natural que fosse inteiramente obediente à doutrina revelada da criação poderia ser suficiente como um guia moral completo por si só. A ordem natural faz reivindicações sobre nós, que devemos reconhecer e atender; mas as reivindicações são genéricas e, em algumas situações, confrontamos mais de uma delas. Pode parecer-nos que as focas devem ser protegidas; mas a família e a vida comunitária dos caçadores de focas da Terra Nova também. O ser humano também é uma criatura com seu próprio sentido e finalidade naturais, e parte dessa finalidade é exercer autoridade sobre o resto da natureza. Embora devamos certamente insistir que sua autoridade não pode ser devidamente exercida a menos que ele tenha uma verdadeira compreensão e amor pela natureza, não obstante, ele tem uma discrição e uma capacidade real de fazer escolhas que não são dadas inerentemente na própria estrutura da natureza.

E a essas considerações devemos adicionar mais uma: em nossa situação concreta na história da salvação, estamos lidando enquanto seres humanos caídos com uma natureza caída. Nós e a natureza estamos sob o julgamento de Deus que nos criou, e esse julgamento se reflete em uma série ascética de deveres e vocações que estão numa relação paradoxal com objetivos e funções naturais. Assim, devemos “odiar” nosso pai e nossa mãe, nossa esposa, filhos, irmãos e irmãs, e até mesmo nossa própria vida, a fim de ser discípulos de Cristo. Permitindo o elemento retórico aqui, ainda sim devemos reconhecer uma demanda que está totalmente fora do escopo da ordem natural e, porque a própria ordem natural está em rebelião contra Deus, vai contra ela. Outra vez, existe a possibilidade de um chamado ao celibato, ‘fazendo-nos eunucos,’ como diz Jesus, por amor ao reino dos céus; e aqui também devemos reconhecer uma demanda escatológica que vai contra o curso que a natureza indica.

Não podemos nos permitir, então, exaltar uma ética em que tudo é dado na natureza, nada deve ser revelado na história. Mas também não podemos seguir o outro caminho, abandonando totalmente os valores dados em favor de uma perspectiva exclusivamente escatológica.

Os Reformadores evitaram as consequências de seu abandono formal do valor natural porque se apegaram fortemente à revelação decisiva de Deus na história passada que incluindo as Escrituras, bem como o próprio Cristo, na realidade lhes permitiu ter seu bolo e comê-lo. Eles ainda reconheceram valores naturais dados, embora não sob esse nome, porque eles reconheceram a Cristo. [3] Mas quando a crença numa revelação passada decisiva foi abandonada, as verdadeiras implicações de abandonar a natureza começaram a se tornar aparentes. O resultado foi uma crença indeterminada no progresso.

A crença no progresso pode ser considerada como a “história de salvação” sem salvação. Há um otimismo geral, mas nenhuma compreensão da história como a restauração do que foi perdido, a recuperação das coisas como sempre deveriam ser. O valor e o sentido agora surgem do próprio fato da transformação em si; não há outro critério, a não ser o simples fato da mudança, pelo qual podemos julgar o bem e o mau. “Progressista” e “reacionário” tornam-se os termos padrões de elogia e censura. Apesar de seu otimismo, é à doutrina do progresso que devemos atribuir grande parte da ansiedade e do desconforto de nossos tempos. Pois quando o futuro é conhecido apenas como a negação do que é, e não como a afirmação mais profunda de sua verdadeira estrutura, então ele é simplesmente estranho a nós. Não podemos enxergá-lo com esperança, pois a esperança requer algum ponto de identificação entre o que se espera e quem espera por ela. As únicas formas de encarrar o futuro são com medo ou com a excitação selvagem e auto-destrutivo que pode tomar conta de uma pessoa quando ela está à beira de um abismo insondável.

Entre o Naturalismo e o Historicismo — Raça

Pode-se escolher muitos exemplos de como a ética cristã encontra seu caminho entre um naturalismo estático e um historicismo desenfreado. Escolho um conhecido, talvez banal, no qual o verdadeiro julgamento moral envolvido provavelmente não seja controverso entre nós, mas no qual a igreja cristã tem sido tanto corajosa como eficaz. Me refiro, é claro, ao racismo. Existem dois tipos de preconceitos raciais que merecem esse nome. Por um lado, existe o que às vezes é chamado, também, de “tribalismo.” É uma filosofia naturalista ingênua, na qual se acha que a raça ou a tribo tem mais importância na estrutura das coisas do que a humanidade como um todo, provavelmente porque é mais limitada e, portanto, mais facilmente concebível. A raça é conhecida e amada como um tipo natural. A vida é vivida em obediência ao bem fragmentado que este tipo revela. É o vício do simples, uma manifestação da xenofobia que sempre caracterizou os protegidos e inexperientes. Por outro lado, há o racismo que motivou os nazistas, e hoje motiva pelo menos uma sociedade Ocidental, nascida de uma filosofia historicista. Este é um vício do sofisticado. Ele reconhece o fato de que a humanidade é maior do que a tribo; mas não concede ao tipo, como é dado na natureza, nenhum amor ou lealdade. A existência da espécie humana não pode fazer nenhum sentido, exceto à luz de uma proposta para transformá-la em outra coisa. Mas como tudo o que é tradicionalmente chamado de humanidade não pode ser incluído na transformação do homem em super-homem, as fronteiras da humanidade devem ser mantidas fluidas. O esquema das coisas pode ser reorganizado a serviço de uma civilização econômica ou científica em desenvolvimento, na qual apenas parte da humanidade pode ser admitida.

A resposta cristã ao racismo apelou tanto à natureza quanto à liberdade histórica. Os cristãos apontaram para Cristo, o Filho do Homem e Deus feito homem, para estabelecer o valor de cada ser humano. Por um lado, não podemos continuar elevando a tribo acima da raça humana quando notamos como o Salvador do mundo rompeu o tribalismo mais intransigente para estender a oferta de salvação até os confins da terra. Nossa leitura dos fenômenos naturais tem que ser controlada pelo que aconteceu, pela mulher siro-fenícia e pela visão de São Pedro. Por outro lado, não podemos tratar o significado da humanidade como uma mera relatividade histórica quando cremos que Deus fez da humanidade sua possessão. Aqui está uma categoria que nunca pode ser transcendida na história; mas assim que afirmamos isso, afirmamos algo sobre a estrutura da realidade, não simplesmente como ela está se tornando, mas como ela é dada.

Tensões na Ética Evangélica

Isso tem alguma relação com uma divergência que tem perturbado nossos próprios pequenos círculos nos últimos anos, entre aqueles que nos impõem uma ética de “reino” e aqueles que apóiam uma ética de “criação.” Nem reino nem criação podem ser conhecidos independentemente um do outro. Aquele que é chamado de Rei dos reis também é chamado de Segundo Adão: nele a natureza e a história não estão divididas. Seríamos tolos se nos permitíssemos ser polarizados dessa maneira, e ainda mais tolos em conceber tal polarização em termos de Esquerda e Direita, como se a própria profunda questão filosófica envolvida pudesse ser resumida em um clichê político.

No entanto, podemos sugerir em conclusão que pode haver um divisão legítima de interesses entre nós que aparenta nos alinhar em campos naturalistas e historicistas. Temos que proclamar o evangelho em contextos culturais e filosóficos diferentes. Muitos de nós têm profunda simpatia pelos problemas do Terceiro Mundo, regimes tirânicos, famílias opressivas e estruturas tribais, má distribuição de recursos e assim por diante, e, falando autenticamente aos naturalismos estáticos que produziram e agravaram tais problemas, falaremos escatologicamente de transformação, e até mesmo, com uma ousada mas possível desapropriação da linguagem, de “revolução.” Outros de nós estão preocupados principalmente com os problemas do mundo Ocidental, os abusos da tecnologia, a ameaça à família, o domínio do poder financeiro e assim por diante, e descobrem que precisam constantemente apontar para os dados da natureza criada. Sem dúvida, há uma tentação aqui: é fácil para um grupo pensar no outro como “conservador” ou “radical.” Mas sempre que fazemos isso, excluímos um lado do equilíbrio natureza-história e condenamos nossa própria postura a ser menos cristã por falta desse equilíbrio. Espero que nesta conferência possamos fazer o esforço mental e espiritual exigido de nós de pensar além das questões que são tão importantes para nós no momento e aprender a valorizar as preocupações uns dos outros. Ao fazer isso, nos aproximaremos do ponto no qual podemos compreender a metafísica cristã em sua totalidade e perceber seu significado para a ética.

Reflexões

Conferências, principalmente se forem boas, são uma forma de captar o próprio pensamento num momento de transição. Isso representa um problema para “o livro da conferência:” ou o autor reescreve sua contribuição inteiramente à luz de seis meses mais lutando com seus problemas, ou então ele a deixa como está como uma espécie de foto da ação, resignando-se a seu caráter provisório, sem pose. Os assuntos abordados nesta palestra continuarão a me deixar perplexos por algum tempo, então estou razoavelmente satisfeito em seguir o último caminho, meramente eliminando irrelevâncias e um erro absoluto. Mas as discussões na conferência me convenceram de que, se quisesse me fazer entender, devo oferecer alguns esclarecimentos e defesa de um ou dois pontos, e tentei atender a essa necessidade nessas reflexões. Devo uma palavra de agradecimento a todos aqueles que me pressionaram fortemente com argumentos, me forçando a pensar mais, mas especialmente a minha esposa, Joan, que foi a primeira a abrir meus olhos para esses problemas.

A. O ‘Natural’ na Teologia

O termo “natural” possui dois usos adequados na teologia cristã: um ontológico, em contra-ponto com “histórico” (“história” sendo usado no sentido Hegeliano de história com uma finalidade), o outro epistemológico, em contra-ponto a “revelado.” (Há também um terceiro uso inadequado, em que “natural” significa “caído”; sobre isso, mais abaixo.) O que os dois usos de “natural” têm em comum é que se referem a tudo que não é a auto-entrega de Deus em Jesus Cristo. Conhecimento natural é aquele que não depende diretamente de Jesus e de suas testemunhas designadas, os apóstolos e profetas. A ordem natural é aquela que não é produzida como resultado da história salvífica. Mas embora o “natural” não seja uma parte da salvação através de Cristo, também não se opõe a ela, pois é a obra do mesmo Deus, o criador e sustentador de tudo. Em ambos os casos, o natural é pressuposto e redimido através da obra da salvação: o conhecimento natural é restaurado pela revelação, a ordem natural das coisas pela histórica da salvação.

A “ética natural” que foi defendida nesta palestra é “natural” no sentido ontológico — isto é, ela deriva da ordem criada. Com o conhecimento natural da ética, a palestra não se preocupou. Talvez alguns pensem que seja menos confuso, uma vez que é tão importante distinguir os dois usos, reter o termo “natural” apenas para fins epistemológicos, e encontrar outro — “criado” sugere-se — para dar conta da coisa em contextos ontológicos. Contra essa proposta, entretanto, há três considerações que entendo ser decisivas.

Primeiro, “natureza” e “história” são termos filosóficos básicos, e seu uso nos permite falar de maneira mais eficaz a debates importantes que acontecem fora da igreja.

Em segundo lugar, precisamos de um termo mais amplo que “criação,” que incluirá também o que comumente é designado na teologia cristã de “providência”— isto é, a obra de Deus na história que não seja diretamente história com finalidade ou da salvação — a obra de preservar e sustentar o universo criado. A ética cristã considera importante falar de uma ordem natural que abrange as disposições providenciais de Deus para o ser humano caído (na esfera política, por exemplo), e que não se limita às formas primárias nas quais o ser humano recebe seu ser criado. A falha em falar dessa maneira conduz à suposição totalmente não teológica, não sem seus defensores entre os presentes na conferência, que essas formas secundárias de existência natural são simplesmente o produto da própria engenhosidade construtiva do ser humano.

Em terceiro lugar, o termo “natural” é usado de maneira famosa na Versão Autorizada em 1 Co. 2:14, para traduzir a palavra psuchikos usada por São Paulo: ‘o homem natural não recebe as coisas do Espírito de Deus.’ Na conferência de High Leigh, fui muito imprudente em criticar essa tradução. Induzido ao erro pelo RSV e outras versões modernas quanto ao que apóstolo quiz dizer, considerei os tradutores Stuart culpados de uma confusão tipicamente protestante do natural com o caído. Mas Paulo não estava falando do homem caído nesses versículos, como sua própria interpretação do contraste psuché-pneuma em 1 Co. 15:44 deixa bem claro.

B. Os Pontos de Vista de T. F. Torrance

Citei a frase ‘objetividade competente’ do artigo do professor Torrance, citado abaixo. No decorrer da conferência, o Dr. David Cook persuadiu-me a examinar mais cuidadosamente os pontos de vista de Torrance e especialmente seu livro Ciência Teológica. Foi uma descoberta animadora.

A “objetividade competente,” pela qual Torrance elogia uma investigação científica um tanto idealizada, não é uma atitude desapaixonada, mas uma absorção abnegada no objeto de investigação com base no conhecimento de que Deus o criou. Também não impõe à natureza uma estrutura de tipos arbitrariamente concebida, mas responde totalmente aos tipos que a natureza possui em si mesma e revelará ao investigador. Assim, o significado das coisas é imanente a elas e naturalmente conhecido. Mas não o seu propósito. Valor é conferido à criação somente pela graça divina e não pode ser discernido de forma imanente dentro dela. A teoria da teleologia natural, que visa traçar as interconexões intencionais dos tipos, é rejeitada como uma forma de idolatria. Assim, medido pela grade medieval tardia, Torrance seria um voluntarista, mas não um nominalista. A objeção de Torrance à teleologia natural é que ela falha em distinguir a criação do Criador, uma objeção que é válida contra algumas, mas certamente não contra todas as versões da teoria. Em contra-ponto, devemos levantar a objeção de que o valor supostamente conferido à natureza pela graça divina é uma mera abstração, a menos que possa ser reconhecido, com ou sem a ajuda da revelação, nas interconexões intencionais entre tipos. Só assim podemos perceber que o universo é uma “ordem” e afirmar, com o criador, que ele é ‘muito bom.’ Sem a possibilidade desse discernimento, a doutrina da criação está destinada a sumir de vista, e a vontade-de-controle autônoma do ser humano deve assumir o comando, impondo propósitos humanos onde Deus aparentemente omitiu os divinos. Que, claro, é a história da cultura Ocidental desde a Reforma.

Quando a revelação é barrada em principio de comunicar qualquer informação substancial sobre os tipos na natureza, e quando a ciência é barrada em princípio de observar interconexões intencionais entre os tipos, a possibilidade de um conhecimento unificado da ordem natural é perdida. Nos resta a visão fragmentada proporcionada por uma pluralidade de ciências arbitrariamente definidas. A objeção que levantamos contra Dooyeweerd se aplica com mais força ainda a Torrance: a criação de Deus não deve ser responsabilizada por uma fragmentação que, na verdade, é devido ao problema do conhecimento na humanidade caída. (Sobre esse assunto, o artigo de Rahner, citado abaixo, é importante.) A teologia está comprometida com a busca de uma visão unificada. As implicações devastadoras da fragmentação científica para a ética cristã não são levadas em conta por Torrance, provavelmente porque ele mede toda a ciência pelas normas da física e não se preocupa com as ciências humanas, onde a questão surge de forma mais aguda.

Lista para Leitura

BARFILED, Owen. Saving the Appearances: A Study in Idolatry. Middletown: Wesleyan University Press, 1988.

DOOYEWEERD, Herman. “A Ideia Cristã do Estado.” In: Estado e Soberania: Ensaios sobre Cristianismo e Política. São Paulo: Vida Nova, 2014.

GRANT, George. “In Defense of North America.” In Technology and Empire: Perspectives on North America. Toronto: House of Anansi Press, 1969.

RAHNER, Karl. “Theology as Engaged in an Interdisciplinary Dialogue with the Sciences.” In: Theological Investigations XIII. New York: Crossroads, 1983.

TORRANCE, T. F. “The Influence of Reformed Theology on the Development of Scientific Method.” In: Theology in Reconstruction. Grand Rapids: Eerdmans, 1965.

——— . Theological Science. London: Oxford, 1969.

Notas

[1] Conferir Reflexão B: Os Pontos de Vista de T. F. Torrance

[2] Conferir Reflexão A: ‘O Natural’ na Teologia.

[3] O fato de que alguns pensadores da Reforma (notadamente Calvino, e posteriormente Hooker) tinham lugar para a doutrina tradicional da Lei Natural, não invalida esta generalização sobre as tendências do Protestantismo.

Oliver O’Donovan é membro da Academia Britânica, da Sociedade Real de Edinburgh, e professor emérito de Ética Cristã e Teologia Prática na Universidade de Edinburgh (2006–2013). O’Donovan também lecionou no Wycliffe Hall (1972–77), na Universidade de Toronto (1977–1982) e na Universidade de Oxford (1982-2006). Suas obras incluem Ressurreição e Ordem Moral, O Desejo das Nações, e a trilogia Ética como Teologia.

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Ruan Bessa

“Fim? Não, a jornada não acaba aqui… A cortina cinza deste mundo se enrola e tudo se transforma em vidro prata. E aí você vê…” Gandalf